quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

O inferno são os outros


Ainda gostava de saber o que fazem velhinhos de 70 anos e mais às 9h da manhã no meio da rua com este frio.
Aliás, eu sei, porque quando já eram três exemplares conversavam muito sobre como não conseguem manter-se em casa.
Eu comecei sozinha na paragem de metro - de superfície, em Almada é assim ao ar livre, uma riqueza - e primeiro chegaram dois senhores, muito encolhidos. Talvez em busca de calor humano, mas a minha aposta seria para pura falta de noção, um deles ficou de pé exactamente à minha frente. E quando pensava que a possibilidade de lhe contar os floquinhos de caspa no casaco eram já o expoente máximo da proximidade possível e aceitável entre dois estranhos no meio da rua, o velho consegue pisar-me.
Senhores, eu calço o 36 e não estou a ocupar assim tanto espaço.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

O Desenraizamento

Fui chamada de assistência, quatro dia fora de casa, e comecei a chorar. Quem me ligou falava como se me estivesse a convidar para uma festa: quem me dera esganá-lo. Amaldiçoei quem quer que tivesse faltado.
Numa semana dormi quatro noites em casa. Num mês devo andar por aqui cerca de 60 por cento dos dias. Ou talvez esteja a exagerar.
A verdade é que estas contas pesam-me. Faz-me falta vir dormir a casa.
As pessoas desabituam-se de mim e eu delas. Faz-me impressão que os meus pais já não me liguem ao fim-de-semana a perguntar se vou almoçar.

Éramos só mulheres, dez, a trabalhar e parecíamos as melhores amigas na carrinha a falar de cinema e a rir muito. Assim que chegamos e nos misturamos com a vida real desaparece tudo e já nem nos lembramos de quem eram. Nem onde fomos.

Chego a casa e já me passou a neura. As saudades em vez de aumentarem atenuam. Quase desaparecem. Tudo toma uma importância relativa, uma vez que daqui a nada já me vou embora outra vez.

acerca da menina