domingo, 30 de outubro de 2011

Não lamento

Se o meu telefone também serve para não atender e a minha porta de casa para não abrir.
Seja a quem for.

Acordei cedo, pus roupa a lavar, arrumei a cozinha do jantar de ontem, fomos à natação, fiz o almoço, arrumei a cozinha de novo, limpei a gaiola do canário, estendi a roupa. Acabada de sentar na cama de rede, a apanhar o pouco sol que ainda restava, a miúda acabada de adormecer ao meu colo: campaínha a tocar. Epá não.
Eram os meus pais. Azar.
Meia hora depois, de novo a campaínha insistentemente.
Deitei-a na cama, resmungou. Fui abrir a porta, de caminho apanhei o saco da natação ainda parado à porta e fui estendendo as toalhas e fatos de banho enquanto eles entravam, calçados. São os únicos que cá em casa não tiram os sapatos à entrada. Disse-lhes.
Viraram costas ofendidos.
Azar.
Bateram com a porta e acordaram a míuda.
Azar.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

O orgulho dá lugar ao cinismo

Pedi dispensa de duas horas diárias durante uma semana de formação obrigatória antes de começar a trabalhar.
Escreveram-me que não, que não ia dar, que fosse tratar de comprar a bomba.
Como assim amamentar? mas o bebé não tem já nove meses?
Fazem assim tanta diferença as duas horas?
então e depois a trabalhar, como vai fazer?
tem que se desvincular do bebé o quanto antes,
nunca ninguém nos tinha posto esta questão!
a nossa profissão não está abrangida pela lei geral do trabalho,
mesmo que sejamos multados, nada vai mudar.

Entre outras pérolas foram as respostas que fui recebendo até que acabei por ter de engolir o orgulho e fazer as oito horas diárias durante dois dias, para não prolongar mais uma discussão de surdos.
Não valeu a pena dizer quem decide até quando vou amamentar sou eu e não vocês meus cabrões, porque ninguém quis ouvir e não houve CITE nem ACT que fizesse cumprir a legislação. Pelo menos em tempo útil.
E foi assim que esta empresa perdeu uma trabalhadora que vestia a camisola com orgulho, que atendia as chamadas fora de horas, que lhe defendia a honra e o bom nome.
Porque mesmo desconsolada de saudades saí para o trabalho ainda de madrugada segura que não seria tratada como um número, que alguém me daria valor e me trataria com a dignidade, reconhecendo um direito que, antes de ser meu, é da minha filha.
Enganei-me.
Não vou descurar o meu trabalho, não se preocupem senhores passageiros, o meu brio profissional prevalece. Apenas cresci e passei a ser um número. Só isso.

acerca da menina